quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Kassab é fresquinho porque vende mais


"(O Kassab) é outro inimigo", disse o Racional Mano Brown à Folha de S. Paulo desta quinta-feira. "Desde que assumiu, o número de shows dos Racionais diminuiu muito. Tudo que ele faz hoje é contra a cultura negra, não deixa o povo tomar a frente. É um governo racista do caralho". Ainda bem que ele disse. Kassab é isso mesmo e muito mais. É um racista de forte contorno autoritário.

Enquanto diz ser inconcebível que não haja um estacionamento para o Teatro Municipal e agradece a São Pedro quando os mendigos não morrem de frio, Kassab economiza no ônibus, na urbanização de favelas, na canalização de córregos, na construção e reforma de escolas. Foi assim no primeiro semestre deste ano: seu governo utilizou menos de 20% das verba direcionada a essas obras. Isso porque, pelo segundo ano consecutivo, a receita do município cresceu acima da inflação.

Quem mora em São Paulo tem a nítida sensação de que a cidade está lá por empréstimo. Grafite tem que ser autorizado. Artista de rua é proibido. Skate é mau-visto. Violão na praça, caso de polícia. Usuário de droga é empurrado pros cantos. Tudo isso, debaixo das lâmpadas - que, pelo mesmo corte orçamentário, mais escurecem que iluminam - da metrópole. É uma cidade cujo dono é a Prefeitura que, uma vez ao ano, empresta seu espaço à população, na Virada Cultural. Tem hora pra começar, hora pra terminar e é só. É uma piada pensar que ele busca inspiração em Paris (passa mais tempo aqui do que no Brasil)... Aqui é tudo ao contrário: músico em cada esquina, grafite tem uma rua própria, transporte de qualidade a baixo custo pela cidade inteira, enfim. Não lembra São Paulo em nada.

Tudo isso faz parte da ideologia torpe do Kassab, o político apolítico. Mas a mais grave e mais sorrateira de todas as ideologias do prefeito é a não-ideologia. Ele fez um diagnóstico preciso do carreirismo na política brasileira. Após sucessivos Tiriricas, Clodovis e Franks Aguiares da vida, ele percebeu que há um político para cada ocasião. Acertando o "timing", o "targeting" e o "sense of opportunity", pode-se vender qualquer marca política no Brasil. O único empecilho para isso é o saudosismo de quem ainda preza por uma ideologia - o direitista e o esquerdista convictos. Mas, mesmo eles são elegíveis se o momento for propício. Para a manutenção do poder na terra do fisiologismo e do carreirismo político, basta criar um guarda-chuva que comporte qualquer ideologia. Se for preciso ter um comunista indignado, voilà. Se for o caso de um Bolsonaro, alguém que fale pelas tradições da família, contra homossexualidade, negritude e outras promiscuidades, voilà também. É tudo uma questão de conhecer o público alvo... Digo, público eleitor.

A verdade é que o PSD não é um partido político. É um varejão com produtos para todos os gostos. Neste varejão, o Kassab é um gigolô; e seus políticos apolíticos, suas putas. Essa aberração é um vírus oportunista que enxergou que a fragilidade do corpo político brasileiro reside no fato de que a propaganda se sobrepõe à discussão política. Então, pra que discussão política, se a gente pode encerrar qualquer eleição no espaço publici-otário? Posso fazer um lixo de governo - literalmente, já que sob Kassab, os catadores perderam dinheiro e ganharam jornada - e me dar nota dez. Posso chamar um "Dia do Orgulho Hétero" de "só mais um dia" e depois dizer, didaticamente, que as minorias têm direito a manifestação por causa de uma história de opressão etc, etc, etc. Basta sacar a maré do meu "target".

Abrir mão da ideologia é um luxo ao qual nenhum formador de opinião pode se dar. Muito menos alguém que tem um cargo executivo. Um político que abandona a ideologia para fazer-se aprazível a qualquer eleitor é um homem sem caráter, disposto a comprometer todo o corpo democrático em nome de sua própria megalomania. Como bem definiu Mano Brown, é um inimigo. E esse, é melhor não subestimar.

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